Estar em Casa!

A casa pode ser um lugar de sossego, retorno, passagem, descanso, afeto, companheirismo, desafeto, ausência, violências, queixas, intrigas, tédio e solidão. Uma casa é um mundo - um espaço geográfico produtor de subjetividades. Para muitos ficar em casa, quando por escolha, pode ser uma dádiva quando por necessidade, uma tortura. Porém, quando o assunto é a preservação da vida, como a que estamos vivendo, ficar em casa, ultrapassa qualquer lógica individualista. Não se pode negar que, embora necessário, estranhamos o encurtamento das fronteiras que o isolamento em casa nos impõe. Dizem que somos modernos, a esse preço temos casas-dormitórios, pois é longe dela que a vida acontece maior parte do tempo. Até mesmo o trabalho oficial em casa tem um tom de não-trabalho. O convite-ordenança de ficar em casa nos coloca em outro tempo-espaço dentro do lugar mais íntimo que é nossa casa. A casa-isolamento nos convoca a outros modos de relação conosco, com o outro, com os objetos, com a organização, com os afazeres, com nossas inquietudes ansiosas e as incertezas que nos perseguem. Ter uma casa para se isolar, para se ocupar é um privilégio, considerando que há casas-corpos expostos que perambulam a céu aberto pelas ruas, delas não há como se isolar - ao contrário elas expõe um universo de desigualdades de isolamentos. Uma casa, repleta de significados, guarda em si um apelo ao coletivo. Sonha-se por uma casa, gasta -se uma vida de trabalho por ela, mas percebe-se, na emergência, o quanto é difícil usufruir de uma casa. Estranhar o habitual que nos habita é uma faceta do isolamento social, mas o que parece estranho pode salvar vidas - a minha, a sua, a nossa. Permita-se sentir sua rotina modificada e, com serenidade, retirar dela o aprendizado que ela traz. Por certo não sairemos desse momento os mesmos. Ninguém sai.